terça-feira, 13 de setembro de 2011

Michelle*


Eu não sei como ela consegue, mas seu jardim está sempre florido. Vez ou outra, quando a brisa é forte o suficiente para carregar perfumes e branda o bastante para ser agradável, eu consigo sentir o cheiro das flores que enfeitam o seu quintal.

(Minhas preferidas são as amarelas, que murcham quando ela chora escondido nas noites frias, mas voltam a desabrochar quando ela reencontra o sorriso que sempre carrega).

Quando é dia de sol, as borboletas azuis vêm pousar nas flores e se misturam ao céu de brigadeiro. Mas quando a noite cai, são os vaga-lumes que vêm brincar com os botões de seu jardim (tenho para mim que eles gostam da presença dela tanto quanto eu). Da varanda, onde eu me sento ao seu lado, é maravilhosamente impossível distingui-los das estrelas e ninguém, além de nós duas, conhecerá o prazer de ver uma estrela voar quando um vaga-lume se cansa do sossego de uma flor.

Mas eu nunca saberei a sensação de andar entre essas rosas, pisar na grama verde, ou sentar em meio às borboletas.
O jardim não aguentaria. As pétalas são frágeis, as borboletas medrosas.
Ela não aguentaria. Ela não deixaria ninguém entrar no seu precioso jardim, nem mesmo eu.
Mas tem o nascer do sol atrás dos montes ao longe, o contraste do azul das borboletas com o amarelo das rosas, as estrelas voadoras. E tem também aquela música, que de vez em quando ela toca e enche o ar, e a minha vida, de alegria. Eu posso ver tudo isso daqui da varanda.
E enquanto eu puder ver tanta beleza, não me importo que ela não me deixe ir ao jardim. Não me importa que ela esconda bem o coração, que abafe a solidão. Porque, mesmo depois de tanto tempo, eu ainda estou aqui, e não vou sair do lugar. Ela sabe disso. Eu sei disso.
E, ainda que eu não caminhe entre as flores, eu consigo enxergar toda a beleza do seu jardim.


E isso basta para mim.

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