sexta-feira, 27 de julho de 2012

Bosta de Elefante

Eu não aprendi a falar. Perdão, não aprendi. Quero esclarecer uma coisa: nada do que eu escrevo é sobre amor, nem este texto, nem nenhum dos outros. Não escrevo a dor do amor, a alegria do amor ou o que quer que venha com ele. Odeio a ansiedade de vivê-lo e odeio a mania que as pessoas têm de enxergá-lo em todo canto. Maldita neblina que se apossou da vista de todos, até os textos me roubou. Eu o odeio, o amor. É provável que dizer isso não agrade a vida e eu já estou sinceramente arrependida, mas não sou de mentir, não posso fingir. É fato, eu o odeio. Acabo de descobrir isso e afirmá-lo é como tirar um peso das minhas costas. Vivi até agora suportando sua distante existência, ignorando sua ausência, mas já chega. Talvez seja porque ele deixou que eu me sentisse sozinha, não apareceu ou não foi suficiente, eu continuei só independente dele, mas não importa. Quero ao menos minhas palavras, não peço mais nada. Não preciso de nada além da minha liberdade de escrita, mas acontece que ele distorce tudo que eu rabisco. Ninguém entende o que meus textos dizem e eu não aguento, quero de volta a única coisa sobre a qual eu tenho controle e que o tal amor me roubou, quero minhas palavras, minha liberdade. Eu não sou mais nada. Não aprendi a ser ninguém. Eu sou a menina de cinco anos sentada no banco de trás do carro dos meus pais olhando pela janela, vendo a paisagem passar correndo e ficando enjoada. Ainda sinto a tonteira e o gosto de bílis. Querendo abrir o vidro, sair pela janela, esticar a mão e segurar a paisagem. Fazê-la permanente, fazê-la parar de ir embora, de me deixar sozinha, de me abandonar, eu quero ir com ela. A garotinha do papai, tão lindinha... Sempre fui, ainda sou e estou cansada de ser. De ser a "filha dele", a "filha dela", sou até a " irmãzinha dos meus irmãos", só não me deixam ser eu mesma. Tiraram de mim as palavras, e até o meu nome (que eu sei que tenho, só não consigo me lembrar qual é). Chata. Grossa. Estúpida. Violenta. Rabugenta. Deve ser um desses, deve ser... Me colocaram no banco de trás do carro do meu pai, apertaram-me o cinto e enfiaram tudo goela adentro, um bando de baboseiras que eu não sou. Disseram que eu tinha que engolir o choro e com ele, aos poucos, fui engolindo a mim mesma, enquanto tudo o que eu queria era o frescor e a leveza que esperavam do lado de lá do vidro, junto às árvores apressadas. Eu me engoli. Calei o que eu pensava, o que eu queria; me calei pra viver o papel que me deram sem chatear ninguém. Eu não aprendi a falar. Eu só aprendi a escrever, minha única liberdade, que agora não me pertence mais por culpa do amor. Eu estou de saco cheio. De saco cheio de tudo, de toda essa bosta de elefante libanês. Não me pergunte o porquê de a bosta ser de elefante ou o porquê de o elefante ser libanês, eu nem sei se existem elefantes no Líbano... tanto faz, a vantagem de ter um lápis e um papel é que você pode escrever a idiotice que te der na telha e, já que eu não posso escrever o que quiser sem parecer uma adolescente ridiculamente apaixonada, é assim que vou conservar minha liberdade, escrevendo bosta de elefante libanês por todos os lados. Enchendo meus textos de bosta de elefante! Não que antes eles fossem bons, mas enfim... Eu nunca tinha escrito sobre mim, não assim, botando pra fora tudo que passa na cabeça. Não faz o meu estilo, nunca quis, acho chato. Mas tudo bem, estou cansada de ser eu. Ou de não ser eu, melhor dizendo, seja "eu" quem for. For... Eu vou. Vou embora. Sim, embora, é a melhor maneira de dizer o que eu sinto. Eu vou embora daqui, é a única explicação que posso dar, não há o que acrescentar, isso é tudo. Não, não estou sendo vaga... Entenda, eu nunca aprendi a falar.

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